domingo, 10 de março de 2013

Dormirei, boas novas acharei


Os problemas de comportamento e de falta de concentração de muitos estudantes encontrariam resolução (pelo menos em boa parte) com uma boa higiene do sono.

Dizia-me há pouco tempo uma menina de 11 anos, excelente aluna e com uma motivação incomum para se envolver em todos os desafios que lhe surgem, desde os académicos até aos sociais e aos lúdicos: "Porque tenho que dormir? Que perda de tempo. Tantas coisas interessantes que tenho para fazer!". Confesso que houve tempos em que me identifiquei com este pensamento, mas o peso da experiência acumulada com a idade já me faz sentir no corpo que "O dormir é meio sustento" (ou mais do que meio!). Poderia, a estes provérbios, acrescentar uma ideia que o meu corpo me obriga a reconhecer como verdadeira: "Não dormir é um autêntico veneno." Há muitas pessoas a quem o corpo não fala tão claramente, e lá se vão elas deixando seduzir por ocupações noturnas como programas de televisão, jogos no computador ou saídas até tarde, acreditando que dormir é desperdício de tempo. E como "O uso adquirido, sono perdido", lá se vai o hábito de "Deitar cedo e cedo erguer [que] dá saúde e faz crescer." No meio de tantos provérbios, onde está afinal a verdade?

Nas nossas salas de aula, vemos com alguma frequência alunos que cabeceiam ou então chegam mesmo a adormecer. Vemos outros que têm dificuldade em manter a atenção ou então se mexem constantemente na cadeira. Se o sono indicia claramente uma noite mal dormida (ou mais), já a irrequietude ou a dificuldade de concentração podem ter muitas causas, mas uma delas é o não se ter dormido o suficiente. O que acontece com um bebé quando não dorme? Fica rabugento e ninguém tem dúvidas das razões dessa impertinência. E quando não dormimos, não sabemos perfeitamente que ficamos mais irritadiços, com menos paciência, menos tolerantes, com mais dificuldade para nos concentrarmos, com tendência para fazermos leituras mais "negras" dos problemas? O mesmo acontece com as crianças e os jovens. Torna-se difícil estar com atenção nas aulas; o corpo começa a pedir movimento e a torcer-se na cadeira; a piada que um colega diz é interpretada como um insulto e paga com um estalo bem dado, ao qual ele responde com um murro, a que se pode seguir uma luta a sério.

Vistas as coisas assim, percebe-se que "não dormir, é um veneno". E daí até podermos convencer-nos de que "Dormirei, boas novas acharei."? Como posso ajudar a minha amiguinha a compreender que o tempo passado a dormir não é desperdiçado?

Dormir o suficiente é fundamental para a aprendizagem de coisas novas e para reforçar a memória. Quando aprendemos algo, a informação é retida na memória de curto prazo. Esta precisa de ser consolidada, processo que se prolonga enquanto dormimos, levando a um aumento da memória. Durante o sono também relacionamos informações que estão dispersas e conseguimos encontrar ideias criativas, por exemplo, para resolver problemas. Quem é que ainda não teve a experiência de acordar com uma ideia genial para resolver um problema para o qual, até aí, não tinha conseguido encontrar solução? Estas são algumas das "boas novas" que poderemos achar com um sono repousado. Mas as "boas novas" não vêm só da possibilidade de termos ideias criativas. É também uma "boa nova" a descoberta de se conseguir ter uma melhor concentração nas aulas e de as explicações e atividades aí surgidas começarem a fazer sentido mais rapidamente, tornando-se mais interessantes. Os problemas de comportamento e de falta de concentração de muitos estudantes encontrariam resolução (pelo menos em boa parte) com uma boa higiene do sono (cumprimentos de regras de sono adequadas).

"Boas novas" resultam também da recuperação do equilíbrio necessário para lidarmos com as emoções e memórias, particularmente com as negativas. Com efeito, a falta de sono contribui para uma maior irritabilidade e para uma maior dificuldade de autocontrolo. Depois de se ter dormido bem, a tal piada dita pelo colega, embora possa não ser muito engraçada e até um pouco infeliz, pode receber o desconto que merece ou ter uma resposta mais ajustada do que um estalo. Ignorar o que se ouviu, responder assertivamente "Não achei graça ao que disseste." são duas possibilidades. E, desta forma, se torna mais fácil adquirir competências de relacionamento interpessoal e evitar situações de conflito. Uma vez mais, alguns problemas de disciplina deixariam de existir e o relacionamento entre as crianças poderia melhorar. Ressalvo que a falta de um sono reparador não é a única justificação e dormir bem não é uma solução milagrosa; é, contudo, um fator a considerar.

E para quem acha que "não consegue adormecer cedo", será boa ideia analisar as rotinas que antecedem a hora de deitar. É frequente as crianças e os jovens resistirem a ir para a cama. A televisão e o computador no quarto em nada ajudam, pois torna-se difícil aos pais conseguirem efetuar uma vigilância eficaz. O que fazem muitas das crianças/jovens renitentes em ir para a cama à hora devida? Normalmente navegam na net, jogam videojogos ou veem televisão. Claro que, com estas tentações, não há sono que se aproxime. Só a firmeza dos pais na negociação e aplicação de rotinas saudáveis pode "curar" esta falta de sono. É indispensável ser definida e estabelecida uma rotina com uma hora de deitar adequada, à qual se antecede um período em que o computador e a televisão já estão desligados e são praticadas atividades relaxantes, como, por exemplo, ler, conversar um pouco ou tomar banho.

"A quem dorme descansado, dorme-lhe o cuidado." Torna-se, com efeito, mais fácil ver os problemas com uns óculos mas mais otimistas (embora não irrealistas) e mais capazes de analisar as situações pelo lado positivo, facilitando a procura de soluções. Nesse sentido se diz também que "O sono é bom conselheiro:" Por fim, relembro o provérbio com que comecei: "Dormirei, boas novas acharei." Enquanto dormimos, aprendemos, descansamos e preparamos o nosso corpo e o nosso espírito para um novo dia.
Nem sempre é tarefa fácil para os pais, com o difícil quotidiano dos dias de hoje, encontrarem horários que permitam a conciliação do convívio familiar e do cumprimento das tarefas do fim do dia com a instituição e manutenção do hábito de as crianças se deitarem cedo. Se elas perceberem que dormir não é desperdício de tempo, poderão ser mais colaborantes. A negociação das regras pode ajudar. No entanto, a firmeza dos pais na sua aplicação não pode ser dispensada. "O sono é bom conselheiro." O bom senso, a coerência, a persistência e a assertividade também são.


Armanda Zenhas/Educare